Médica e filha de aliado político do presidente da Câmara mantinha salário em gabinete parlamentar enquanto trabalhava em duas prefeituras na Paraíba
Uma funcionária fantasma mantida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), voltou ao centro de uma nova denúncia de acúmulo irregular de cargos. Louise Figueiredo de Lacerda, filha de um aliado político de Motta, chegou a ocupar simultaneamente três funções públicas remuneradas — uma no gabinete do parlamentar em Brasília e outras duas como médica nas prefeituras de João Pessoa e Alhandra (PB).
A irregularidade só veio à tona após a Folha de S.Paulo questionar a Câmara sobre o caso. A exoneração de Louise foi publicada no site oficial da Casa após o contato da reportagem, o que indica que o desligamento não havia sido realizado anteriormente, mesmo com as denúncias anteriores.
Em julho deste ano, a Folha já havia revelado que Hugo Motta mantinha três funcionárias fantasmas em seu gabinete. Louise era uma delas — e a única que permaneceu no cargo após a exposição pública. Na época, ela cursava medicina em período integral na Faculdade Nova Esperança, em João Pessoa, e chegou a morar em outro estado enquanto seguia oficialmente lotada no gabinete do deputado em Brasília.
Mesmo após a repercussão do caso, Louise continuou vinculada à Câmara até outubro de 2025. Nesse período, se formou médica e passou a ocupar dois cargos municipais, sem abrir mão do salário federal.
Documentos oficiais mostram que ela iniciou no gabinete de Motta em agosto de 2018, com vencimentos de R$ 2.800 mensais, além de R$ 1.800 em auxílio, totalizando cerca de R$ 240 mil recebidos desde então.
Em agosto de 2025, Louise passou a integrar o quadro de médicos da Prefeitura de João Pessoa, com salário de R$ 9.400 mensais. Em 18 de setembro, foi contratada também pela Prefeitura de Alhandra, cidade localizada a cerca de 40 km da capital paraibana, para uma jornada de 20 horas semanais, segundo dados do Ministério da Saúde.
A legislação brasileira veda o acúmulo de cargos públicos remunerados, exceto em casos específicos previstos no artigo 37 da Constituição, como dois vínculos de professor ou um de professor com outro técnico ou científico — o que não se aplica à função de secretária parlamentar.
Até o momento, Hugo Motta não se manifestou sobre o caso. A Câmara dos Deputados também não informou se será aberta investigação interna para apurar o período em que Louise recebeu indevidamente pelo cargo federal enquanto exercia outras funções.
O episódio levanta novamente questionamentos sobre nepotismo, uso político de cargos públicos e impunidade dentro da estrutura da Câmara, especialmente em gabinetes de parlamentares com forte influência regional.
Por Marcos Soares
Jornalista – Analista Político instagram.com/@marcossoaresrj
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