Os estados da região Nordeste, a maioria comandada por partidos de esquerda ou do centrão, apoiaram o Decreto 12.432/2024 do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que limita o uso das forças policiais, como a utilização de arma de fogo apenas como último recurso. Mas muitos deles aparecem em diversos levantamentos com os piores indicadores de violência em comparação com estados do Sul e do Sudeste que são contra a política de segurança de Lula.
Dos cinco estados brasileiros com maiores números de homicídios em 2023, último registro já compilado, três são do Nordeste. A região também tem dois dos três estados onde mais se matam policiais no Brasil e cinco dos dez estados com maior registro de furtos e roubos de veículos.
Alguns destes estados também se destacam pelo não esclarecimento de mortes com características de crimes. De pouco mais de 17 mil crimes contra a vida (assassinatos, tentativas de homicídio e roubos seguidos de morte) sem solução em 2023, quase 20% dos casos estão no Nordeste. Por lá, ainda há outros indicadores que pesam negativamente à segurança pública. Das dez unidades da federação onde mais se rouba celulares no país, seis são do Nordeste.
Para especialistas, aceitar passivamente o decreto de Lula, apresentado como um “presente de Natal”, pois foi publicado na véspera da data comemorativa, representa um risco a profissionais da segurança e, sobretudo, à população. “O decreto pode provocar uma disparada ainda maior desses indicadores, da morte de policiais que ficam restritos a utilizar armas de fogo apenas como um último recurso, oferecendo tempo e chances de criminosos atentarem contra a vida dos profissionais da segurança o que deixa toda a população mais vulnerável”, alerta o advogado, especialista em segurança pública, Alex Erno Breunig.
Os temas relacionados à segurança pública e políticas adotadas pelo governo Lula estão no centro de embates entre governadores em diferentes regiões do Brasil, como os do Nordeste, do Sul e do Sudeste. Enquanto os do Nordeste apoiam as medidas de Lula, governadores do Sul e do Sudeste se mostraram contrários e resistentes ao decreto em questão e a outras políticas que impactam à segurança, como a de desencarceramento de presidiários, defendida pelo ministro da Justiça e Segurança Pública (MJSP) Ricardo Lewandowski e à PEC da Segurança Pública que, pela proposta inicial apresentada em outubro de 2024, tira poder e autonomia dos estados centralizando-os na União.
Para mostrar apoio incondicional a política de segurança pública de Lula, os nove governadores que integram o Consórcio Nordeste assinaram no domingo (29) uma carta de apoio às medidas anunciadas pelo governo federal no dia 24 de dezembro. O documento revela, na avaliação de especialistas, restrições severas às forças policiais no Brasil acirrando a queda de braço com governadores do Sul e Sudeste, que se mostraram contrários e pediram a revogação da medida sob a alegação que policiais ficarão mais vulneráveis e a possibilidade do avanço da criminalidade.
Os governadores do Consórcio Nordeste apontam seis argumentos para apoiar a política de Lula. Entre eles estão que as medidas do governo não alterariam a autonomia dos estados e que a violência letal só pode ser usada como último recurso.
Em sua defesa, o governo federal diz que o decreto é uma sugestão de protocolo de atuação dando aos estados a opção de não segui-lo, porém, gestores que deixarem de adotar as regras com suas polícias civis, militares e penais ficarão sem recursos de fundos importantes à segurança pública.
Mapas da Violência evidenciam problemas com a criminalidade
Os dados da criminalidade em estados do Nordeste estão estampados em registros, como o Mapa da Segurança Pública, divulgado pelo próprio Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) em 2024: três dos cinco estados que mais tiveram registros de homicídios em 2023 estão naquela região.
Dos 37.639 casos de homicídio doloso registrados no Brasil ano retrasado, em casos onde há a intenção de matar, a Bahia lidera o ranking com 4.620 registros. Em segundo lugar está um estado do Sudeste, o Rio de Janeiro com 3.566 casos. Na terceira colocação está o estado de Pernambuco (Nordeste) com 3.332 e o Ceará (Nordeste) vem em quarto lugar com 2.893. Fecha a relação dos cinco mais violentos em homicídios dolosos o estado de Minas Gerais, no Sudeste, com 2.657 casos.
Segundo o mesmo levantamento do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2023 o Brasil registrou 965 latrocínios, os roubos seguidos de morte: o Nordeste tem dois dos três estados onde há mais casos deste tipo de crime: Pernambuco é o segundo com 81 registros ano passado. O estado está atrás apenas de São Paulo com 167, que tem uma população quase cinco vezes maior. A Bahia é a terceira do ranking, com 69 latrocínios.
“Os efeitos da segurança pública são medidos pelos reflexos do que acontece nas ruas. Casos elevados de roubos e latrocínios demonstram que todas as pessoas estão altamente vulneráveis, que a segurança falha. Quando o estado falha nas ruas, quem age são os criminosos que se sentem mais à vontade para furtos, roubos, latrocínios, tráfico. Limitar a ação policial é ampliar poderes das facções e de grupos criminosos”, alerta o especialista em segurança pública, que por décadas atuou nos serviços de inteligência das forças federais de segurança, Sérgio Gomes.
Alguns governos de estados do Nordeste que apoiam o decreto de Lula também aparecem em destaque quanto à morte de agentes de estado, sobretudo os policiais. Das 187 assassinatos de profissionais registrados em 2023 no Brasil, Pernambuco aparece na terceira colocação com 13 mortes de policiais.
A Bahia vem em seguida com 11 casos e o Ceará com 9. Estes estados só perdem para o Rio de Janeiro (51), o Pará, na região Norte (29) e São Paulo (28), no Sudeste.